A perda de competitividade do etanol frente à gasolina, consequência da desoneração dos combustíveis no Brasil e mudanças nas políticas tributárias, fez com que as indústrias de etanol de milho migrassem a produção de hidratado, vendido diretamente ao consumidor final, para o etanol anidro, que é adicionado à gasolina. Estimativa da Unem (União Nacional do Etanol de Milho) aponta uma redução de 8,6% no total de hidratado na safra 2022/2023 e aumento de 17,1% na produção do anidro.

Levantamento do Instituto Mato-Grossense de Economia Agropecuária (Imea) no início da safra 2022/2023 apontava para uma produção de 1,47 bilhão de litros de etanol anidro e de 2,92 bilhões de litros de etanol de milho hidratado. Em dezembro passado, estes dados foram revisados para 1,72 bilhão de litros de anidro e 2,67 bilhões de litros de hidratado.

A migração está diretamente ligada ao comportamento do mercado no país. De acordo com dados da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), o consumo de etanol hidratado no país ao longo de 2022 caiu, até novembro, 8,5%, passando de 15,520 bilhões de litros (janeiro a novembro) em 2021 para 14,198 bilhões de litros.

Em compensação, o consumo da gasolina aumentou 9,5% entre 2022 e 2021, no acumulado de janeiro a novembro. Ao todo, 38,601 bilhões de litros foram consumidos até novembro do ano passado, ante 35,249 no mesmo período de 2021.

O presidente-executivo da Unem, Guilherme Linares Nolasco, explica que esta ferramenta de alternância na produção de etanol é uma ferramenta das indústrias para evitar prejuízos e atender ao mercado. “Com a perda de competitividade do etanol em grande parte do país e aumento da demanda por anidro para ser adicionado à gasolina, as indústrias têm flexibilidade para ajustar a produção e manter o abastecimento”.

Ainda segundo Nolasco, este aumento de consumo de gasolina frente ao etanol tem vários impactos negativos, pois força a demanda por etanol anidro e diminui a oferta de hidratado no mercado em meio a entressafra da cana-de-açúcar, estimula o aumento de importação de gasolina, tendo em vista a dependência externa do produto refinado e, com isso, inicia um círculo vicioso de diminuição da competitividade do biocombustível frente ao combustível fóssil e fuga de divisas.

“Outro ponto é com relação ao consumo de um combustível de matriz energética fóssil, não renovável e altamente poluente. Quando o governo desonera os derivados de petróleo, vai na contramão dos acordos internacionais para redução das emissões de gases de efeito estufa e de mudanças climáticas”, explica o presidente da Unem.

Suporte na Entressafra

Com o início da entressafra da cana-de-açúcar que vai de novembro a março, até poucos anos atrás, era comum os consumidores perceberem um aumento acentuado nos preços do etanol ocasionado pela diminuição da produção e oferta do produto no mercado.

A partir do estabelecimento da produção de  etanol de milho no Brasil, esta variação foi atenuada porque o setor trabalha em fluxo contínuo de 365 dias ao ano, garantindo o abastecimento no período crítico da entressafra da cana e com grande facilidade de migrar a produção do hidratado para o anidro conforme a demanda do mercado.

Nesta safra, entre os meses de maio e outubro, foram produzidos 358  milhões de litros de etanol de milho em média por mês. Agora, entre novembro de 2022 e abril, este volume será de 372 milhões de litros por mês.

De acordo com Guilherme Nolasco, o etanol de milho trouxe mais estabilidade para o setor de biocombustíveis, garantindo o abastecimento ao longo de todo o ano. Além disso, com o processamento do grão no Brasil, o setor produtivo passou a trabalhar com maior previsibilidade, uma vez que as indústrias compram o milho antecipadamente.

“O etanol de milho movimenta toda uma economia circular, que vai desde a valorização do grão e da geração de renda para o produtor até a oferta de produto e estabilidade de preço aos consumidores finais. Ao equiparar a carga tributária dos biocombustíveis com a gasolina, o governo federal fere preceitos legais e  desestabiliza toda essa cadeia produtiva, inclusive trazendo insegurança para os investidores”, afirma Guilherme Nolasco.

Evolução

Nas últimas cinco safras, a produção de etanol de milho no Brasil aumentou 450%, passando de 790 milhões de litros na temporada 2018/2019 para 4,39 bilhões de litros na safra 2022/2023. Neste período, o processamento de milho pelo setor passou de 1.47 milhão de toneladas para 10,1 milhões de toneladas. A produção nacional do grão também aumentou neste intervalo, de 100 para 125 milhões de toneladas, assegurando o abastecimento interno e a demanda das indústrias de etanol de milho.